Azueira, freguesia situada no extremo norte do concelho de Mafra, na margem esquerda de um afluente do rio Sizandro. |
A acolhedora e abastada freguesia de Azueira, localizada a 16 quilómetros da sede concelhia e a cerca de 40 da Capital, estende-se por "vinhedos aveludados e pomares coloridos" entre as freguesias de Turcifal e Freiria, do vizinho município de Torres Vedras, a norte; do Gradil e Vila Franca do Rosário a sul; a nascente, novamente Turcifal e Enxara do Bispo; e, a poente, a freguesia de Sobral da Abelheira.
Ocupando uma área de aproximadamente 1505,761 hectares, Azueira é composta pelos lugares de Aboboreira, Almeirinho Clemente, Antas, Azueira de Baixo, Azueira do Meio, Bandalhoeira, Barras, Caneira Nova, Caneira Velha, Carrascal, Casas Novas, Casal da Cerca, Casal Pão Coito, Casal Pinheiro, Casais de Santa Cristina, Fornea, Livramento, Roxa, Sevilheira, Tourinha e Vermoeira.
Povoada desde épocas pré-romanas, documentos arqueológicos atestam a sua ancestralidade. O topónimo Antas, por exemplo, indicia a presença de monumentos dolménicos, actualmente inexistentes. Contudo, sabe-se que, no local, foram recolhidos machados de pedra polida, vulgarmente denominados por "pedras de raio".
A Quinta do Castelo, por outro lado, poderá ter sido o local escolhido pelos lusitanos para construir o seu castro, antes mesmo da chegada dos romanos à Península. Etimologicamente, Azueira provém do vocábulo arcaico "azevo", que se refere, provavelmente, à vegetação encontrada na região aquando da instituição da Freguesia, depois do Movimento de Reconquista Nacional.
Azueira é também uma palavra latina, atestada pela lápide sepulcral encontrada na Albergaria do Espírito Santo ou de Nossa Senhora da Luz, que pertenceu à tribo Galéria (importante circunscrição administrativa do Império Romano), conforme se depreende da inscrição: "M IVLIVS MF / CAL CALLVS / H S E / QVINTVS TONGIVS" (Quinto Júlio Tongio a mandou fazer à memória de Marco Júlio Galo, da tribo Galéria, filho doutro).
Talvez, este Júlio Tongio fosse parente da Júlia Tongeta, cujo nome se inscreve na lápide encontrada na Quinta de São Gião (Torres Vedras). Do espólio do Museu do Carmo, faz também parte um cipo cupiforne (arca cinerária) de calcário, achado no lugar do Livramento, com a seguinte inscrição romana: "C[aio] IVLIO C[aii] F[ilio] CAL[eria tribu] MAXSVMO" (A Gaio Júlio Máximo, filho de Gaio, da tribo Galéria). Datável do século I d.C.. Pela quantidade de vestígios romanos encontrados na região, presume-se que a via romana de Mafra a Torres Vedras terá passado por aqui.
Outros topónimos, como Almeirinho e Sevilheira têm origem mourisca e germânica, facto que comprova a passagem de outros povos por esta região úbere e verdadeiramente encantadora. Dominada durante vários anos pela força mourisca, Azueira foi reconquistada definitivamente em 1147, após a tomada de Torres Vedras, a cujo termo passou a pertencer. Ao longo dos séculos seguintes, integrou os bens da coroa que a privilegiou de diversas maneiras.
A rainha Santa Isabel, por exemplo, dotou-a de uma Albergaria destinada a recolher os pobres viandantes. Facto curioso relacionado com esta Freguesia ocorreu no dia 15 de Fevereiro de 1368. Nesta data, Frei Gonçalves Soutinho, celeireiro e procurador do Mosteiro de Óia, no bispado de Lisboa, denunciava, em audiência pública realizada nos paços do concelho de Torres Vedras e presidida por Paio Correia, almoxarife geral desta vila, os enfiteutas do Casal da Azueira por não cumprirem as cláusulas contratuais, nomeadamente, quanto à ocupação, cultivo e pagamento das prestações acordadas.
[AHNMadrid: Clero, carpeta, 1835, n. 16] Firmada a paz com Castela e consolidada a independência Nacional, o domínio do Mosteiro de Óia sobre os bens possuídos em Torres Vedras e Lisboa, rapidamente encontraram o seu termo. Em 2 de Novembro de 1423, D. João I, acedendo à súplica do Dom Abade, ordenava a Fernão Lopes que lhe passasse pública-forma de toda a documentação relativa aos bens possuídos em Torres Vedras.
[AHNMadrid: Clero, carpeta, 1843, n. 1] Porém, estas precauções de pouco lhe valeram, porquanto, em 19 de Novembro de 1434, se viu obrigado a ceder, a D. Duarte, todos os bens do Mosteiro, sito em Torres Vedras, Atouguia, e outras localidades do arcebispado de Lisboa, pela quantia de 500 coroas de ouro.
[AHNMadrid: Clero, carpeta, 1844, n. 17] Referida como aldeia em 1527, na quinta da Azueira vivia, nesse ano, Estêvão de Castro, sogro de D. Rodrigo de Castro, comendador de Seia. Em termos eclesiásticos, de acordo com as informações constantes nas Memórias Paroquiais de 1758, Azueira foi um curato da apresentação dos fregueses, tendo a sua paróquia (instituída provavelmente entre os séculos XIII e XIV) sido anexa à de Santa Maria do Castelo, de Torres Vedras. Inicialmente na Igreja de São Pedro dos Grilhões, a sede da Paróquia passou para a Igreja de Nossa Senhora do Livramento, facto que se deveu ao desenvolvimento do culto à Virgem, sentido desde o século XVII (centúria em que se construiu a primitiva Ermida).
Apesar de nunca lhe ter sido concedida Carta de Foral, Azueira ascendeu à categoria de Vila em 1820, chegando mesmo a constituir Concelho. De acordo com os estudos levados a cabo por Mário Guedes Real, o concelho de Azueira "não vem citado nos mapas da reforma de 1836, pelo que se depreende que foi então suprimido; mas, no decreto de 24 de Outubro de 1855, está mencionado como sendo então extinto, entre os da Comarca de Torres Vedras, o que nos leva a supor que teria sido restaurado em qualquer altura do período que decorreu entre essas duas reformas".
Alguns documentos referem que o referido Município fora instituído em 1837. Apesar da sua vida efémera, o concelho de Azueira chegou a constituir um dos maiores da Estremadura integrando as freguesias de Azueira, Turcifal, Sobral da Abelheira, Freiria e Enxara do Bispo. A participação dos Azueirenses na revolta liberal da Maria da Fonte (1846), foi um dos marcos históricos que marcaram para sempre o sentido de justiça e de independência característico dos fidalgos moradores do antigo Concelho. "[...] 26 de Maio de 1846. Compareceu o administrador interino de Torres Vedras, Maurício José da Silva, acompanhado de uma guarda a cavalo e a pé.
Reuniu-se clero, nobresa e povo das freguesias do Concelho, todos fizeram público e manifesto de aderir aos princípios do grito nacional, principiado na província do Minho, contra o sistema governativo do Ministério Cabral, protestando não mais obedecer às suas ordens, tendo o dito Administrador proposto ao povo se queria nomear Administrador e Junta Governativa, o povo foi unânime em declarar que de hora em diante obedeceria à Junta Governativa de Torres Vedras e seu Administrador onde outr’ora pertencia a maioria deste Concelho, e em seguida, o povo nomeou para regedor da Freguesia de S. Pedro dos Grilhões de Azueira, Boaventura Rodrigues Tornixa e, para seu escrivão, António Pedro Baptista da Silva Avelino.
Seguiu-se a nomeação dos regedores para as outras freguesias. [...]" (extracto do auto da Câmara lavrado em Maio de 1846) Região bastante rica e terra pródiga, a mais produtiva em vinho, frutas e trigo, Azueira é hoje, pelo desenvolvimento que lhe é reconhecido, o exemplo da vontade de quem quer encarar o futuro com um sorriso tranquilo e repleto de esperança. Azueira voltou a ser elevada a Vila em Abril de 2001.
Vale sempre a pena recordar as personalidades que, tendo vivido, ou apenas nascido na freguesia de Azueira, contribuíram para o engrandecimento da sua Terra. São disso exemplo:
Dr. Carlos de Lima Galrão
(Livramento, 21/Out./1857 — Mafra, 3/Ago./1953)
"Descendendo de ilustres famílias da nossa terra, nasceu o Doutor Carlos de Lima Galrão, no lugar do Livramento, em vinte e um de Outubro de mil oitocentos e cinquenta e sete, onde exerceu clínica seu pai, o Doutor Sabino José Maltez dos Anjos Galrão.
Educado, primeiro, num são ambiente familiar, e depois, no Colégio Militar, cedo adquiriu uma sólida formação moral e uma rectidão de carácter, que timbraram todos os actos da sua longa vida. Dotado de um espírito brilhante e de uma invulgar inteligência, depois de cursar preparatórios na Academia Politécnica do Porto, formou-se em medicina na Escola Médica-Cirúrgica de Lisboa, apresentando uma notável tese, a que foi atribuída a mais alta classificação.
A sua carreira profissional iniciou-se em Sintra como médico municipal, onde pouco tempo permaneceu. Chamava-o a sua terra, à qual dedicou toda a sua vida, como médico e como cidadão. Assim, por deliberação desta Câmara de sete de Novembro de mil oitocentos e oitenta e oito foi nomeado Facultativo Municipal das freguesias de Mafra, Alcainça, Igreja Nova e Cheleiros.
Em três de Dezembro do mesmo ano foi nomeado médico do Hospital de Nossa Senhora das Dores, eleito Procurador à Junta Geral do Distrito em Novembro do ano seguinte e, em vinte e um de Maio de mil oitocentos e noventa, nomeado inspector de saúde, cargo que exerceu durante mais de sessenta anos. Em dezanove de Maio de mil novecentos e vinte e oito, foi eleito sócio correspondente da Associação dos Arqueólogos Portugueses.
Prestou serviços clínicos na Escola Prática de Infantaria, no Corpo de Salvação Pública — Bombeiros Voluntários de Mafra, no Terço de Infantaria Legionária número três, desta vila e na Casa do Povo. Ao ser atingido pelo limite de idade que o compeliu ao abandono das suas funções oficiais, cheio de vigor e ainda no pleno uso de toda a sua inteligência e grande saber, não abandonou porém o cargo de Director Clínico do Hospital de Nossa Senhora das Dores, que exerceu até trinta e um de Dezembro de mil novecentos e cinquenta e um.
A sua vida profissional exercida num tão vasto campo e que encarou como um verdadeiro sacerdócio caracterizou-se por uma bondade sem limites e por uma inigualável dedicação. Os pobres de que era incomparável protector e o melhor amigo mereceram o seu especial carinho.
Por isso, Carlos Galrão não granjeou fortuna, mas adquiriu uma maior riqueza, a gratidão e as bênçãos do povo a que deu tanto da sua vida e da sua ciência. E se na sua vida profissional e caritativa, o Doutor Carlos Galrão deixou bem vincada a sua personalidade, não podemos esquecer a vida política, em que a inteireza do seu carácter se evidenciou igualmente. Fiel às suas convicções, só em mil novecentos e vinte e seis, após o advento da actual situação, voltou à actividade política, tendo presidido à primeira Comissão Concelhia da União Nacional, cargo que exerceu no momento em que vacilava a existência do Estado Novo, muito tendo contribuído as campanhas doutrinárias que sustentou na imprensa para que, entre a população deste Concelho se criasse um quase unânime ambiente de simpatia e aplauso à política de Salazar.
A sua opinião autorizada, a auréola de prestígio que sempre o rodeou aliada a uma excepcional integridade de carácter, muito contribuíram para a indicação dos presidentes deste município, entre os quais me coube essa honra e ainda o da minha dupla recondução.
O apoio e os louvores que dispensou sempre à acção camarária, através da imprensa e dos discursos em que a sua palavra experiente e cheia de interesse era para nós um imperativo, proferidos com elegância e vivo entusiasmo, fizeram com que por vezes este Município se abalançasse a iniciativas um tanto arrojadas, na sua ânsia de fazer sempre mais e melhor. Tão altos foram os serviços prestados pelo Doutor Carlos Galrão no exercício da sua profissão que o Governo do País o condecorou com a Comenda da Ordem de Benemerência e, no último ano da sua existência, a Legião Portuguesa o distinguiu com a Medalha de Dedicação.
Considerando que, quer como cidadão, quer como político, quer como médico, a vida do Doutor Carlos Galrão deve ser apontada como um exemplo raro de bondade, de aprumo moral e de integridade de carácter impõe-se a esta Câmara o dever e a honra de consagrar o seu nome". (Proposta do presidente da Câmara Municipal de Mafra, de 30 de Abril de 1954, para a erecção de um busto, em homenagem ao Dr. Carlos Galrão).
D. João da Soledade Moraes
(Azueira — Mafra, 16 de Novembro de 1870)
Cónego regrante de Santo Agostinho, cuja regra professou dispensado de pagar o "piso", quantia em dinheiro indispensável para fazer parte da comunidade. Com a extinção das ordens religiosas, veio como primeiro prior para a freguesia de Mafra, em 1835. Para além de músico e poeta, participou em publicações impressas, nomeadamente sobre Medicina.
Na torre da Igreja do Livramento, existe um sino com a seguinte inscrição: "Dom João da Soledade / Aqui primeiro prior / Ordenou o eu vos chamasse / Para louvar ao Senhor / Feito por António Fernandes / Paulo Amadeu em S. Domingos de Carmões em 1864".
Da sua obra poética, destaca-se, a título de exemplo, esta bonita novena em honra de Nossa Senhora do Livramento: "Sois mãe amorosa, Que a todos nos ama E afável nos chama Com plácida voz Da divina graça Sois dispensadora, Soberana Senhora, Virgem singular! Vinde vós Anjos do Ceo A louvar a Mãe de Deus, Empregai as vossas vozes Em cantar os louvores seus".
A tradição oral cumpre uma função fundamental no processo de aculturação, a que todo o ser humano se sujeita, desde o dia em que nasceu. Porque na História de uma comunidade são muitos os acontecimentos que deixam marcas para a posteridade, não admira que, ao longo dos anos, se tenham discorrido numerosas lendas e contos populares acerca dos mesmos, como forma criativa de transmitir os costumes, as tradições e as crenças comuns às gerações vindouras.
O orago desta freguesia é São Pedro dos Grilhões.
Com base em estudos e nos censos, Azueira tem registado ligeiros progressos na densidade populacional. Em 1930, o número de habitantes era de 2473 e existiam 603 fogos. Em 1991, registavam-se 2476 habitantes, 863 famílias, 992 edifícios e 1065 alojamentos.
Em 2001, o número de famílias subiu para 1042, o de edifícios para 1188 e o de alojamentos para 1310. Divisão Etária (2002): Crianças: 8 % Adolescentes: 13 % Adultos: 60 % Idosos: 19 % Número de Residentes: Cerca de 2.878 habitantes. Número de Eleitores Recenseados: Cerca de 2.257 eleitores. Área: 1505,761 ha. Situação: Entre as Freguesias do Turcifal e Freiria (Torres Vedras), a Norte; Gradil e Vila Franca do Rosário a Sul; Turcifal e Enxara do Bispo a nascente e Sobral da Abelheira a poente.
Em busca de melhores condições de vida, parte da população activa emigrou para diferentes países europeus. Porém, como não esquecem a sua terra natal, visitam-na todos os anos e, quando regressam definitivamente, investem em diversificadas áreas da Freguesia.
A manifestação artesanal dá continuidade aos costumes de um povo, projectando-o num conjunto de tradições que nos permitem ter um conhecimento mais vasto da região.
Outrora, a Cestaria era uma arte desenvolvida, na freguesia de Azueira, no entanto, acabou por desaparecer. Actualmente, podem-se apreciar trabalhos em madeira, produzidos nas Marcenarias e nas Carpintarias.
As peças de artesanato, cada vez mais apreciadas por naturais e estrangeiros, funcionam como um bom cartão de visita de cada região, uma marca presente de um passado que tende a ser esquecido.
Neste sentido, em Azueira, permanece ainda viva a antiga arte de marcenaria.
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